11 de agosto de 2013

Dou por mim a jantar no balcão de uma tasca

Aquele cheiro a whisky misturado com tabaco e suor. (Mas não aquela. Aquela cheira a casa.)
Aqueles olhares de quem não conhece quem entra pela porta e o silêncio que daí surge. Aquele cumprimento mais formal do que nunca - Boa tarde, o que vai ser?- Aquela sopa caseira, nada igual ao cheiro que paira no ar; o feijão, a couve inteira... Ao tempo que eu não sentia uma sopa assim...No dia seguinte tudo continua igual, menos o cumprimento formal.
-Então Ana, é a sopinha?
-Queria também um prego, por favor. 
Foi o melhor dos pregos. A verdade é que nunca os como, mas aquele era diferente.

O balcão faz-nos sentir viúvos e divorciados. (Viúvos não de nós mesmos, mas dos outros. E divorciados do que queremos, que é não estar ali.)
O balcão obriga-nos a pensar. A explicação está na mesa. A mesa distraí: há sempre televisões, pessoas para observar, comportamentos para avaliar, conversas para ouvir. No balcão não. Há um empregado. Há uma máquina de café, uma série de bebidas expostas "para consumo da casa", a máquina registadora e o preçário a lápis, já sujo de tanta alteração.

Dou por mim a jantar num balcão de uma tasca.
Dou por mim a ser viúva do que me envolve.
Dou por mim a ser divorciada de mim mesma.
Dou por mim a ter medo de me habituar à solidão.
Adeus

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